O abdômen é um cilindro que une o quadril ao tórax. Ele é formado pela barriga (ventre), as costas, as laterais e a cintura. Além de afinar a silhueta e delinear a barriga, os músculos do abdômen possuem algumas funções internas muito importantes como sustentar o quadril e a coluna, respirar, digerir, fazer com que o sangue circule, conter e centralizar as vísceras, carregar o bebê e parir.
Parte Posterior
Na parte posterior do tronco temos a coluna, na qual se prende um conjunto de músculos, em particular o musculo transverso do abdômen, que, como seu nome sugere, está horizontalmente posicionado, em forma de cinta muito larga. O transverso é o músculo mais profundo, ao menos na sua parte superior e posterior. Trata-se de um músculo atípico, uma vez que ele é composto de duas partes muito diferentes no que diz respeito a sua inserção, funcionamento e o papel que desempenha.
Uma parte do músculo transverso do abdômen se situa somente na parte anterior e inferior do ventre, indo de um ilíaco ao outro, logo acima da sínfise pubiana. Nessa região, ele é o músculo mais superficial do abdômen, atravessa o ventre de um lado à outro e está por cima do musculo reto abdominal. Nessa parte baixa, o transverso é fibroso, pouco elástico, constituído pela aponeurose anterior. É ele que sustenta o útero e as vísceras embaixo e na frente, situando-se logo abaixo do útero, exatamente onde as mulheres grávidas colocam a mão no fim do dia, quando a barriga pesa.
A contração do músculo transverso do abdômen e o funcionamento reflexo do transverso inferior
Sua ação é no plano horizontal, afinando a cintura ao se contrair. Ele não provoca nenhum movimento articular, mas se estreita em torno dele mesmo, na exalação. Ele é composto de duas partes.
Na posição vertical, ao expirar, é necessário que o ventre se contraia principalmente e primeiramente na sua parte inferior (transverso inferior), a fim de trazer para cima os órgãos e o útero. Se a contração começa na cintura, tudo é empurrado para baixo. Podemos visualizar uma espécie de cinta de gravidez imaginária com um zíper, que se fecha a partir do púbis e se alarga a medida que a cinta vai aproximando do peito. Já quando nos posicionamos horizontalmente (na postura quatro patas, por exemplo) é possível sentir que toda a cavidade abdominal trabalha, centralizando as vísceras, sem dominante na parte inferior.
O músculo transverso inferior é o músculo do espirro, do vômito e da ejeção do bebê. A parte inferior do transverso funciona diferentemente dos outros músculos. É rígido, mexe muito pouco, dificilmente acionado de forma voluntária. Em contrapartida, ele é poderoso no que diz respeito ao seu funcionamento reflexo, como no espirro e no vômito, inclusive em pessoas pouco musculosas, prova disso é que mesmo pessoas em coma ou sob anestesia geral são capazes de vomitar. As contrações reflexas do transverso inferior fazem subir a massa visceral, fazendo recuar estômago e diafragma. Esse é também o músculo do parto!
O papel do transverso é fazer subir tudo que está abaixo, inclusive o útero. Pode parecer contraditório que esse seja músculo do parto, uma vez que acreditamos que devemos empurrar o bebê para que ele saia. No entanto, sabemos que em determinado momento, bebê e útero deverão se separar. É o transverso inferior que realiza essa separação, enquanto o útero continuará a empurrar o bebê para baixo. O movimento reflexo desse músculo é desencadeado no momento em que o bebê está prestes a atravessar o períneo e a vulva, provocando uma forte pressão entre o baixo ventre e a coluna. Tudo que se encontra abaixo do músculo transverso inferior sobe, inclusive o útero. Nesse altura, o bebê não pode mais voltar, pois sua cabeça já se fixou no último orifício, na espinha ciática. Uma grande pressão onde se encontram os ombros do bebê provoca o encaixe dele no quadril. Esse reflexo aproxima de forma brusca a parte superior dos ossos ilíacos (asas ilíacas), abrindo o orifício inferior do quadril; a subida do diafragma provoca o relaxamento do períneo, como acontece no ato de vomitar. O bebê aponta para fora, mas o útero, a bexiga e o intestinos sobem.
Parte anterior e central
A cintura não se fecha sobre ela mesma na sua parte anterior. Os músculos se prolongam em aponeuroses (aquela pele resistente que torna o músculo compacto, que o reveste).
O músculo reto abdominal são os grandes músculos anteriores que vão do esterno ao púbis.
Do esterno até a parte inferior do músculo transverso, existe somente a famosa aponeurose que envolve as faixas do músculo reto abdominal ( como se essa cinta não fosse elástica em todo seu perímetro). Entre os cordões extensíveis da frente e a coluna vertebral atrás, temos uma faixa muscular elástica. Quando os cordões estão apertados, o cilindro pode se alargar na inspiração , por exemplo, graças ao alongamento da parte elástica. Quando expiramos, o cilindro se estreita porque a parte elástica que foi alongada recupera seu comprimento. Se forçamos a expiração, o ventre contrai ao máximo e a cintura se afina. Se a postura estiver correta, essa sensação pode ser notada inclusive na gravidez, embora em um cilindro bem mais amplo.
Nesse sentido, como o parto é um trabalho involuntário (mulheres em coma podem parir!), não é necessário preparação para o parto, ao menos não uma preparação no que diz respeito a esse aspecto puramente fisiológico.
O músculo reto abdominal é o músculo mais superficial. Em seu percurso, que vai do esterno e das cartilagens costais até o púbis, ele passa de cada lado do umbigo, deixando um espaço, que durante a gravidez vai se afastar para que o bebê se desenvolva. É o que chamamos em anatomia de linha alba, que durante a gravidez em sua parte inferior (do umbigo ao púbis) escurece, tornando-se marrom. Durante o terceiro trimestre da gravidez o músculo reto abdominal aumenta em aproximadamente 15 cm seu comprimento. Vale notar que caso isso não acontecesse, essa musculatura se afastaria tanto que seria impossível reabilitá-la.
É importante observar a organização desse músculo, já que na parte inferior o reto abdominal se torna profundo, passando por detrás do músculo transverso. Na parte baixa do abdômen, durante o esforço, não devemos relaxar nunca, pois é essa região que confere estabilidade para o ossos do quadril. Seu relaxamento pode causar fortes dores nas articulações sacro-ilíacas, na sínfise pubiana, além do risco de que as vísceras (útero, bexiga, intestino) desçam e se projetem para frente.
A contração do reto abdominal
Ele aproxima o esterno do púbis, ajudando a nos inclinarmos para frente. Participa no gesto de levar o busto em direção as pernas (deitada, sentada) e vice-versa.
Ele se parece a uma abotoadora vertical, que se abre ao contrairmos, mas também quando, ao acentuarmos a lordose, o empurramos internamente. A única maneira de evitarmos essa abertura é alongando a coluna - o que o alonga também, aproximando as bordas da abotoadora – e expirar para apertar a cinta.
Nas laterais
Os músculos oblíquos do abdômen ( externo e interno) tem trajetos oblíquos em leque. O interno, preso ao quadril (ossos ilíacos), se dirigem para as costelas opostas. O oblíquo externo desce das costelas em direção ao quadril. Lembra um corpete que contribui para o estreitamento da cinta.
Esses músculos mobilizam o busto em relação ao quadril, permitindo as torções, flexões laterais e translações. Quando não estão em ação, eles se fecham sobre eles mesmos como um espartilho, fortalecendo o efeito de cintura fina e definida do músculo transverso.
Assim, quando acentuamos a lordose, o quadril bascula para frente ( de modo que todo seu conteúdo, o bebê e as vísceras se projetam para frente), o peso se despejando na linha alba; os cordões relaxam fazendo com que o músculo reto abdominal se afaste, o transverso se fixa lateralmente, se afastando do umbigo. Como não é mais possível apertar a cinta e fazer subir os órgãos, o músculo reto abdominal se afasta ainda mais, criando uma espécie de hérnia ao meio, que chamamos de diástase.
Durante a gravidez é natural que a lordose se acentue, o que pode causar o alongamento passivo do músculo transverso e os músculos oblíquos, dificultando a contração devido aos relaxamento dos cordões – diástase do musculo reto abdominal. Apôs o parto, quando é possível se exercitar para aproximar essa musculatura, não existe resposta muscular. É como um elástico que foi alargado durante muito tempo, necessitando portanto de uma verdadeira reeducação. Como normalmente isso não é realizado e um bebê no colo não sobrecarrega menos a coluna do que quando está no ventre e a acentuação da lordose não é necessariamente corrigida, as pessoas cometem um verdadeiro massacre nessa musculatura, fazendo exercícios abdominais que, justamente, encurtam o musculo reto abdominal (como as famosas pedaladas) ao invés de alongá-lo.
COMO FAZER OS EXERCÍCIOS ABDOMINAIS DE FORMA CORRETA
Primeira regra
Nunca encurtar o musculo reto abdominal, mas ao contrário, procurar alongá-lo durante a gravidez. Isso é valido não somente durante os exercícios de yoga, mas também em todos os gestos cotidianos como levantar da cama, se virar, sair do sofá etc.
Para criar espaço para o bebê, é necessário alongar o músculo reto abdominal. Todos os exercícios, todas as posições que liberam espaço entre o peito e o útero são confortáveis para mamãe e bebê. Devemos ao sentar, evitar encurtar o musculo reto, comprimindo as vértebras.
O útero aumenta e cresce para cima. É na parte superior do abdômen que precisamos criar espaço, alongar o músculo reto abdominal principalmente na região próxima à sua inserção superior, nas costelas e no esterno. Exercícios como cobra, extensões da coluna na bola de pilates são extremamente salutares. Ao contrair o transverso, principalmente na expiração, o bebê não é comprimido, a respiração é livre, é possível relaxar completamente o ventre, o que confere ao bebê um ritmo confortante, um vai e vem que lembra as ondas do mar. O ventre deve se movimentar!
Segunda regra
Sempre ativar os músculos do abdômen do mais profundo ao mais superficial, de baixo para cima.
Podemos representar os músculos do abdômen por camadas sucessivas de roupas. Imagine uma moça de antigamente se vestindo: ela começa com uma cinta que aperta e sustenta o baixo ventre, como uma boa cinta de gestação. Em seguida, ela coloca um espartilho justo para afinar a cintura. Para terminar e ficar bonita, ela coloca o vestido com alcinhas. É exatamente como os diferentes músculos do abdômen: o transverso, mais profundo (cinta), os oblíquos (espartilho) que conferem a curva para cintura, e o reto abdominal, que são essa espécie de alcinhas por cima. De acordo com essa representação, é possível afirmar que não é encurtando o musculo reto abdominal que nossa cintura se tornará mais fina.
Este artigo é inteiramente baseado na especialização que fiz de Yoga Embarazo com Bernadette de Gasquet bem como em seu livro “Bien être et la maternité”. Minhas aulas de Yoga prenatal e pos-natal se pautam nos conhecimentos adquiridos em este curso e um intenso estudo pessoal que venho realizando nos meus anos de prática como professora.
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